A Obra do Século (2015)




          Avô (Otto), pai (Leo), filho (Rafael). Três gerações de uma família habitam uma cidade edificada para abrigar os funcionários de uma grande central termonuclear em construção. Em meio a uma rotina desesperadoramente lenta, marcada por frustrações, esses três homens vivem suas vidas cada um a sua forma.
         As personagens representam cada qual uma época (passado, presente e futuro) de Cuba, e os mínimos detalhes de cada imagem do filme possuem uma correlação sólida com a história do país. As imagens são muito bem elaboradas, resultado da excelência nos parâmetros técnicos de filmagem e fotografia. 
         O projeto de grande nação desenvolvido nos anos 1980 (com o apoio da URSS) encontra-se representado pela própria construção da usina nuclear. O passado é o tempo da (mania de) grandeza, do autoritarismo e do controle, justamente as mais fortes características de Otto. 
           Cuba não se reinventou após o período da Guerra Fria, permanecendo congelada no tempo até os dias atuais. A figura de Leo, personificação do presente da ilha, marca uma geração conformada, porém descrente, a qual se submete ao que for determinado. Nos inúmeros confrontos entre o personagem de Leo com os de Otto e Rafael, ele é sempre o que cede. Os outros membros de sua geração, que trabalharam para a construção da cidade e da usina, são mais discretos ainda. Há uma cena os apresentando, porém sua existência é quase que fantasmagórica. A vida deles, dedicada ao projeto da central termonuclear, teve o mesmo fim da usina: uma incompletude, perda de sentido e estagnação.
           E o futuro de Cuba? O personagem do filho, Rafael, calado e alheio, pode não saber ao certo o que quer, mas sem dúvidas mostra ter certeza que  não quer o que está vivendo. Viver em meio a um elefante branco fantasma, não é esse o seu desejo. Não é esse o país que quer.
           A ambiguidade de uma das cenas finais (para quem viu, a cena na qual Otto esmurra a porta para entrar no banheiro, no qual está Rafael) deixa em aberto qual o futuro da nação cubana. Será o colapso ("morte, suicídio") ou o reerguimento ("vôo do foguete")? A central nuclear nunca terminada atualmente sofre obras para tornar-se um depósito internacional de lixo radioativo...
           A película transcorre com evidente destaque a temas e produtos referentes aos anos 1980, período da Guerra Fria, porém se passa nos dias atuais. Isso reforça a estagnação de Cuba, o que também é poeticamente traduzido numa dimensão de tempo dilatada nas cenas. Uma grande metáfora sobre as mudanças na geopolítica atual é a cena na qual o avô tira da parede de seu quarto um quadro ilustrando a catedral de Moscou (mãe URSS) para colocar um calendário com uma mulher chinesa de quimono (será a futura mãe China?).
            "A Obra do Século" é um filme com enorme carga metafórica e poética, e seu caráter semi-documental mostra-se uma enfática crítica e análise da história recente de Cuba. Muito bem filmado e fotografado, ganhou os prêmios de Melhor Filme e de Melhor Diretor no Festival de Roterdã 2015.
         


NOTA: 8,25 / 10


 Filme assistido no Festival do Rio 2015


         

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